top of page
Buscar

A cultura e os produtos e a cultura de produtos

  • Foto do escritor: Alberto Urbinatti
    Alberto Urbinatti
  • 19 de mai. de 2024
  • 3 min de leitura

"As relações que se criam entre grupos desenvolvedores de produtos digitais e grupos receptores e utilizadores são negociações que tendem à interculturalidade em diversos sentidos"


*Escrito em julho de 2021.


Venho pensando ultimamente sobre a relação entre cultura e produto. Basicamente, o que me chamou a atenção para essa vinculação foi a primeira vez que tive contato com o termo cultura de produtos. Isto se deu logo após eu publicar uma resenha sobre o livro “Intercultural communication and Science and Technology Studies” de Luis Reyes-Galindo e Tiago Ribeiro Duarte, o que me trouxe alguns pontos de reflexão que quero compartilhar neste breve texto.


Para quem está familiarizado com as empresas de tecnologia, provavelmente já se acostumou com a cultura de produtos, visto que, segundo Bruce McCarthy, é mais do que um processo ou um conjunto de princípios: é uma mentalidade partilhada sobre o porquê de estarmos em um negócio e sobre a forma como fazemos as coisas.


Pedro Pazitto, em post publicado no blog da escola PM3 que resume a aula de Pedro Axelrud (Product Leader no Nubank), elenca 7 grandes tópicos sobre o estabelecimento de uma cultura forte de produtos: 1) a maneira como o time se organiza (squads, por exemplo); 2) a centralidade dos clientes no processo; 3) o sentimento de ownership que todo o time deve ter; 4) encontrar um balanço entre reagir às mudanças e seguir o plano inicial; 5) também encontrar um balanço entre empoderar e gerenciar; 6) diminuir decisões top-down; e 7) balancear decisões de curto e longo prazo. Grosso modo, como resumiu Ken Norton, uma empresa com uma cultura forte de produtos nada mais é do que um local em que nos deixam realizar o trabalho e entregar produtos que resolvem os problemas dos consumidores.


Uma das grandes referências da área, Marty Cagan, disse em texto de 2013 intitulado "The Inconvenient Truth About Product" que há duas verdades inconvenientes sobre os produtos. A primeira delas é que pelo menos metade das nossas ideias não vão funcionar. A questão mais comum que está em jogo aqui é que os usuários não estariam tão entusiasmados quanto nós com determinada ideia. A segunda é que, mesmo se as ideias seguirem o que ele considera como os passos essenciais para o sucesso de um produto, isto é, serem valiosas, utilizáveis e viáveis, é preciso passar por uma série de iterações para se chegar ao ponto em que elas realmente proporcionam o valor comercial esperado quando implementadas.


Pois bem, acho que aqui fica bastante evidente o fato de que o sucesso de um produto depende do contexto em que ele está inserido, tanto na sua produção quanto na sua audiência depois do lançamento. É nesse momento em que “a cultura” e “os produtos” e a “cultura de produtos” se tangem. O elemento que me parece estar em jogo aqui é a confiança que precisa ser estabelecida entre aqueles que criam o produto e aqueles que o utilizam, inicialmente separados por diferentes graus de distanciamento social dado os diferentes backgrounds culturais. Ou seja, o processo de comunicação que precisa acontecer depende da criação de uma relação mútua de confiança. Este é um dos temas abordados no livro que citei no início de Reyes-Galindo e Duarte (2018).


O processo de comunicação, assim como abordei na resenha, envolve a produção e disseminação de conhecimento como resultado das franjas culturais entre relações humanas e não-humanas e, portanto, também com os objetos. Neste ponto de vista, a interculturalidade pode ser compreendida como resultado não só da internacionalidade e da interetnicidade, mas principalmente da interlinguística, em conjunções complexas de linguagem entre seres humanos e entre seres humanos e máquinas. Desta forma, podemos criar aproximações de que as relações que se constituem entre grupos desenvolvedores de produtos digitais e grupos receptores e utilizadores são negociações que tendem à interculturalidade em diversos sentidos. Entre os diferentes grupos ocorrem processos mútuos de enculturação, ou seja, aqueles nos quais os seres envolvidos aprendem as exigências e adquirem os valores de uma determinada cultura na qual estão inseridos.


ree
https://www.romanpichler.com/blog/what-is-a-digital-product/

Em outras palavras, quando desenvolvemos um produto digital, queremos não só resolver um problema do usuário, mas que ele o resolva a partir das ferramentas que daremos a eles. Por isso, precisamos primeiro "falar a língua" do cliente para que essa conexão ocorra com poucos atritos e menos “distanciamento social”. Por outro lado, o usuário também precisa aprender a "falar a língua" do produto para que este, de fato, crie um valor na sua vida. Essas aproximações podem ir longe. Meu intuito aqui é justamente não as esgotar.


 
 
 

Comentários


bottom of page